sexta-feira, 9 de outubro de 2009

A carne realmente é fraca!



O assunto que vou tratar agora é talvez o tema que mais provoque guerras internas, extravasamentos e acessos de raivas de ambos os lados, favoráveis e contrários, e a não aceitação por grande parte da população.
E isso tudo por se tratar de algo tão peculiar e que há tempos deixou de ser uma fonte vital de nossa existência para passar a ser o nosso maior “pecado” e a nossa maior subjugação.
Afinal de contas, o ser humano, um animal que não tem freio em seus desejos (nem freio moral, nem sustentável), não seria diferente com relação a um de seus maiores prazeres e desprazeres: a comida!
Antes de começar a escrever minha explanação a cerca do assunto, vou dar um breve histórico sobre como essa atitude surgiu.
Tudo começou no ano de 1992 quando eu, aos 8 anos de idade e num precoce despertar de uma consciência ética, decidi virar vegetariana. Antes disso vale a pena dizer que desde que me conheço como um indivíduo que faz parte desse mundo, sempre tive os animais como meus amigos e não como a minha comida e, para mim, os seres a quem meu coração mais transbordava. Tanto que o ativismo em mim já havia feito seu debute quando aos 5 anos de idade denunciei ao IBAMA áreas de mata nativa sendo queimadas por uma indústria de peso.
Bem, na época e na idade em que decidi nunca mais colocar cadáveres em minha boca, o mundo não falava sobre vegetarianismo. Ainda mais com uma garotinha tão pequena e que residia numa cidadezinha do interior do estado de São Paulo. O meu posicionamento e a minha atitude afloraram a partir não só do amor que me condoia, mas também de indagações e de um sentimento de injustiça que era crescente.
Resumindo, só posso agradecer aos meus progenitores por acatarem essa minha decisão tomada tão precocemente, não me forçarem a abandoná-la e ainda ajudarem.
E, com o passar dos anos, o sentimento de injustiça, perplexidade e horror perante a degradação, exploração e tortura que um ser humano é capaz de aplicar num animal, só tomaram proporções inimagináveis.
O problema vai muito além daquela desculpa usual de quem não quer sujar a sua consciência: “Comer carne faz parte do ciclo da vida. É algo natural”.
Porém essa fuga da culpa cai facilmente por “água abaixo” (ou melhor, por sangue abaixo), pois é inconcebível conceituar como “natural” a mecanização, os propósitos, meios e fins de toda a suja indústria da carne.
Como pode se achar natural um animal não se enquadrar nem na definição de onívoro, passando a ser um “devorador cancerígeno”, achando normal a sua “metástase” alimentar compreender desde ovos e leite, um alimento feito somente para filhotes com a função da engorda e do acúmulo de gorduras, passando por insetos, anfíbios, mamíferos em geral (tanto terrestres quanto aquáticos), aves, répteis, crustáceos, moluscos e agora devorando até peixes abissais? Acredito que passamos pelo mundo, como uma draga. Como uma mortal rede de arrasto em todo o oceano. E a nossa boca tendo um poder de matar bilhões de animais todos os dias. Para se ter uma idéia, 1.500 pintinhos são mortos em apenas uma granja todos os dias, e cerca de 600 mil bois são mortos à medida que você lê este artigo.



E estamos pagando um preço muito alto por isso, que vai desde a nossa saúde física, como também moral. Mas, é claro, esse preço é infinitamente menor ao preço que Gaia e os animais não-humanos pagam, por nossa causa.
E é preciso acordar pra isso. Criar urgente a consciência E nos livrar de nossa atitude “viral”.
Qualquer minucioso exame já nos revela exemplos aterrorizadores de onde a indústria da carne, lobis milionários e uma população inerte podem chegar: granjas superpovoadas a um ponto de uma galinha passar sua existência sem conseguir abrir as asas, num espaço equivalente a uma folha de papel, comendo e engordando constantemente para enfim degoladas serem servidas fritas ou assadas; porcos, vacas leiteiras e bezerros mantidos num confinamento ainda pior, com seus membros atrofiados por lhes negarem espaço até para simples passos – a exemplo o vitelo, confinado numa baia escura, preso pelo pescoço, sem nenhum estímulo visual ou convívio com sua espécie, recebendo uma ração pobre em nutrientes para morrer de anemia tornando assim, sua carne mais macia. Baleias, tubarões, golfinhos e toda a sorte (ou melhor, azar!) de peixes e vida aquática esgotados em seus mares e rios.
“Quando o almoço está em jogo, parece mais confortável fechar os olhos à realidade dos matadouros, granjas industriais e outras unidades de produção intensiva de animais de corte. É preferível pensar em bois, porcos e galinhas crescendo felizes numa fazenda idílica, e depois morrendo de forma indolor – o oposto do que ocorre de fato”. (Peter Singer)
E ainda sabemos hodiernamente, que a carne não é insubstituível. Nossa desculpa perante ela é a satisfação do paladar apenas. E essa satisfação não justifica o sofrimento, a degradação e a escravidão que submetemos os animais não-humanos. Dagomir Marquesi, escritor e outro militante da causa, indaga: “A pergunta básica é: nós, humanos, temos direito a isso? Quem nos deu esse direito? Nosso paladar é tão importante assim na ordem das coisas? Um sabor diferente em nossas bocas justifica tudo?”.



Será mesmo que um pedaço tão pequeno de seu corpo, que é a língua (responsável por nosso paladar), pode comandar ações de seu corpo e sua consciência? Pode escravizar seu senso ético? Seu poder de julgamento?
Mas então, o que fazer? Qual a solução? Abolir a carne de nossa alimentação? Para nós humanos, a quebra de conceitos sempre foi algo bem difícil. Não conseguimos aceitar as diferenças e enraizamos e idolatramos os costumes, por mais ignorantes que sejam. O racismo, que é algo considerado “recente” persiste até hoje, bem como neonazistas. Então imaginemos só o especismo que está embutido em nós desde que o homem adquiriu um pouco de raciocínio (raciocínio este bem questionável) e prepotência, o quão difícil é de se desvencilhar. Nunca vimos com bons olhos às mudanças de conceitos. E a cultura sempre dita as regras em nossa sociedade.
Mas a resposta simples para essas perguntas é: a ação prática imprescindível para a mitigação do sofrimento animal é a adoção sim, de uma dieta mais vegetariana pela população.
A terra utilizada para a pecuária serviria ao cultivo de uma quantidade muito maior de proteína vegetal. Aliás, a maior parte das terras cultivadas no mundo não é para alimentar a nossa precária civilização, mas sim para alimentar animais de corte. A Amazônia está sendo varrida do mapa devido a ação da pecuária e da agricultura para alimentar essa pecuária. Florestas e animais criados para gerar carne competem pela mesma terra. A fome mundial está diretamente vinculada à dieta que escolhemos. E o que advém a ela são ainda todas as catástrofes sociais, ambientais e extinções.
Se adotássemos uma alimentação mais vegetal, não seria preciso (devido à menor quantidade de gados, porcos, galinhas, peixes, etc) práticas sofríveis e degradantes à eles, como o confinamento, a extinção em massa, a ingestão de hormônios para seus corpos crescerem em pouco tempo e o abate poder ser feito com meses de vida.
Será que é tão difícil enxergar que cada vez que artificializamos mais esses animais, pensando no retorno econômico e para atender a demanda, sofremos as conseqüências? Doenças como a vaca-louca, gripe aviária, gripe suína, e o ebola são apenas alguns exemplos para comprovar. Segundo a revista inglesa The Economist, nada menos que 60% das doenças humanas surgidas nos últimos 20 anos têm origem em outras espécies animais para consumo humano. “Para tentar controlar essas doenças, cometemos mais brutalidade: enterramos milhões de aves vivas, afogamos gatos selvagens em piscinas de desinfetante. Provocamos o desastre e massacramos as vítimas. Temos um caminho inteligente: racionalizar, humanizar e diminuir cada vez mais o consumo de animais. Ou podemos continuar o banho de sangue. Aí, todos nós pagaremos o preço”. – Dagomir Marquesi
Diante dessas questões, eu acredito que o primeiro passo e o fundamental é ter a noção abrangente dessa opressão, que está nos levando também a morte; é enxergar que estamos sendo ao extremo especistas e provocando a carnificina; e que não somos nada além do que mais uma espécie na Terra, aliás, a pior espécie da Terra. É ter a ética e rever nossos conceitos, pensamentos e atitudes. É não apenas ter um discurso bonito e uma prática vergonhosa. É largar a tirania e aceitar que outras espécies possuem os mesmos direitos que você, que lhe são tão negados.
E acredito que os infindáveis debates entre vegetarianos e onívoros seriam facilmente terminados a partir de uma simples revisão de sua própria consciência. Bastaria a ambos enxergá-la e, vegetariano e onívoro, pesarem e verem qual deles poderia deitar a cabeça em seu travesseiro e sonhar.



Respeitar animais é o mesmo que respeitar os humanos. Pois quando um homem leva um animal aos porões da degradação (e somos bons nisso!), está se degradando junto. “Torturamos animais por diversão, devoramos a carne macia de filhotes, exterminamos espécies inteiras sem uma ruga de compaixão. Somos os senhores do Universo, cada vez menores em nosso egoísmo imaturo. E com toda nossa prepotência “racional”, nos esquecemos de que somos tão animais quanto um jegue ou uma barata, um tigre ou um pardal”. – Dagomir Marquesi.
A libertação animal que proponho defendermos é inadiável e constitui um fim em si mesma, mas também, em última análise, à urgente libertação moral do próprio.
Nosso passado, presente e a previsão do futuro nos mostram a quão nossa espécie caminha junto ao desequilíbrio, para não dizer extinção, e o quanto isso afeta principalmente todas as outras formas de vida.
A grandeza do homem, ressaltada principalmente por poetas que possuem uma visão sistêmica e conseguem enxergar algo além pode ser comprovada em sua magnificência quando usamos a bondade e a ética em nós existentes. Não deixemos conceitos prepotentes e culturas ignorantes sublimar a nossa condição de meros componentes de um planeta “doente por nossa culpa”. Terminando este artigo, deixo uma frase de um ser humano que soube desvencilhar-se desses vícios de grandeza, enxergou o próximo e fez de sua vida, metaforicamente falando, um livro de lições para ser adquirido, absorvido, guardado e eternizado.

“A grandeza de uma nação pode ser medida pelo modo como seus animais são tratados”. Mahatma Gandhi


Mirella Ferraz Nogueira

Um comentário:

Blogger Da Thaís disse...

eu não era vegetariano mais meu amigo e e vi o que acontece com os animais mais um vegetariano menos animais mortos